Como filho e neto de homens do mar, capitães e proprietários de navios, Luiz Maristany de Trias talvez tenha herdado o gosto pela vida de andarilho e a predileção pelos barcos e temas marinhos.

Nasceu em Barcelona, Espanha, em 23 de julho de 1885.

Com 14 anos já frequentava a Academia de Belas Artes de Barcelona, onde estudou com Alejandro Ferrant, Santiago Rusiñol e Pere Borrel. Também realizou estudos em Madrid e Paris durante o tempo em que viveu na Europa.

Participou de Salão de Belas Artes de Barcelona, com 17 anos, obtendo como premiação uma viagem de estudos para Paris.

Por volta de 1906, mudou-se com a família para Buenos Aires - onde viveu até 1937.

Em 12 de setembro de 1945 foi naturalizado brasileiro.

Durante duas décadas não cessou de viajar e pintar, retratando os locais por onde passava. Visitou toda a Argentina; viveu algum tempo em Montevidéu; transferiu-se pra o Rio de Janeiro, onde pintou as praias, os morros e as favelas; esteve em São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul; foi ao Paraguai e daí para o Chile, que pintou de Sul a Norte, realizando, então, as mais significativas cenas marinhas de sua carreira.

Viajava, também, constantemente, à Europa, transportando para a tela cidades e paisagens da Espanha, França, Itália e Portugal. De lá, trazia a força e o colorido do Mediterrâneo para o público da América do Sul. Desta, levava a paisagem de países e climas pouco conhecido dos colecionadores do Velho Mundo.

Realizou, assim, um curioso intercâmbio pictórico, talvez o único do gênero.

Entretanto, é preciso destacar que Maristany não se limitou à pintura de paisagens exóticas e cenas bucólicas. Ele sempre mostrou predileção pelo lado mais simples e humilde de vida. São inúmeras suas telas em que os aspectos de vida dos pescadores, dos favelados e dos trabalhadores mais pobres aparecem retratados.

Foi também um importante documentador de cenas e momentos da história que se fazia no dia a dia das regiões por onde passou. No Rio Grande do Sul, por exemplo, retratou as docas do Guaíba, as ruas e os arredores de Porto Alegre desde a década de 20.

Importantíssimo é o tríptico em que fixou as cenas de demolição do barranco que daria lugar ao viaduto da rua Borges de Medeiros.

Significativos são também as cenas antigas do Vale do Sinos que nos deixou.

Tudo isso com um cromatismo intenso, embora de grande serenidade, obtido pelo jogo febril de cores claras, de uma forma bastante próxima dos impressionistas europeus. Grande parte de sua obra é composta por apontamentos diretos que conservam o brilho e o reflexo do sol sob o qual foram tomados.

Sua importância para o desenvolvimento da arte entre nós não se limitou, entretanto, apenas à sua obra pictórica: formou, com Angelo Guido, Fahrion, Corona, José Lutzemberger, Dias Correia e Castaneda, a equipe que, sob a direção de Tasso Correa, iniciou, a partir de 1936, a renovação do Institudo de Artes, para onde ele foi contratado em 1938, assumindo as cátedras de Anatomia Artísitca e Paisagem.

Pintor livre e amante da natureza, como professor exerceu papel importante não só pela transmissão do conhecimento técnico que acumulara, mas através do incentivo à pintura ao ar livre e ao abandono do excesso de rigidez acadêmica.

Chegou em Porto Alegre em 1922, ano em que conheceu Amélia Pastro, jovem pintora portoalegrense. Foi o fim de suas andanças: casou-se com Amélia, naturalizou-se brasileiro em 1938 e viveu entre nós até 19 de maio de 1964, data em que faleceu.

O jovem aluno do curso de Engenharia Naval em Madrid, herdeiro das tradições do mar e da navegação - que, entretanto, já pintava desde os 14 anos de idade - acabou, assim, após tantas andanças pelo mundo, transformando-se num dos responsáveis pelo desenvolvimento das artes plásticas no Rio Grande do Sul.


"...Maristany é um vigoroso paisagista da luminosa escola impressionista, com uma percepção viva do colorido e de uma técnica nervosa..." / "As Artes Plásticas no Rio Grande do Sul" - Angelo Guido

"...Sua pintura é pastosa, de pincelada curta e justaposta, de colorido em pleno sol e perspectiva aérea a perder-se de vista. Sem contornos rígidos, de acordo com a pintura impressionista..." / "Caminhada nas Artes" - Fernando Corona

Amélia Pastro Maristany e seu esposo, Luiz Maristany de Trias

Em primeiro plano, à esquerda, Luiz Maristany; à direita João Fahrion: no segundo plano, Tasso Correa, ao fundo, secretário do Instituto, na organização de um salão do Belas Artes.

Grupo de docentes do Curso de Artes Plásticas contratados na época (1934-1939) em que o Instituto de Belas Artes -RS encontrava-se na administração da Universidade de Porto Alegre (UPA).

Da esquerda para a direita do observador: João Fahrion, Benito Castañeda, Tasso Corrêa, Fernando Corona, Ângelo Guido, José Lutzenberger, Luis Maristany de Trias e Ernani Corrêa.

Publicação no Jornal Zero Hora do dia 10 de fevereiro de 2022